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Comunicação comunitária expõe disputa de narrativas na sociedade

Uma ferramenta de resistência, luta e alcance da cidadania


Ana Luísa Lisboa, Brenda Ribeiro, João Pedro Corrêa, Larissa Miranda, Paula Alana, Vitória Vilaverde


A comunicação é essencial para a vida em sociedade. Mas seu reconhecimento como direito humano fundamental pela Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) foi aprovado apenas em 1970.


No entanto, muitas são as dificuldades para fazer valer esses direitos. Os veículos de comunicação alternativos às grandes mídias enfrentam diversas dificuldades na conquista de espaço. O direito à comunicação ainda é privilégio de poucos, em razão dos baixos orçamentos, da carência de políticas públicas e devido ao poder dos oligopólios midiáticos no Brasil. A comunicação comunitária atua nesse cenário operando como ferramenta de mobilização social e disputa de narrativas. Feita por e para as comunidades, ela possui um importante compromisso com a cidadania.


Jornal Boca de Rua e a luta pela cidadania

O Jornal Boca de Rua surgiu diante da necessidade de dar voz às parcelas menos favorecidas da população. O veículo de comunicação independente vem sendo produzido, veiculado e vendido por pessoas em situação de rua na cidade de Porto Alegre/RS há 18 anos.


Crítico, questionador e em busca da conquista da cidadania negada a esses sujeitos, o jornal disputa legitimidade e presença na circulação de ideias na esfera pública, através de pautas que são produzidas segundo lógicas democráticas, com linguagem crítica-emancipatória e temas que são de interesse das comunidades.


“Um jornal fala e, por isso, o nosso tem até o nome de Boca. Mas também escuta o povo da rua, escuta outros movimentos. As pessoas também nos escutam quando compram nosso jornal, a universidade nos escuta quando nos chama para falar do nosso trabalho. O outro lado da cidade nos vê porque nos escuta e nos lê. Ver, falar e escutar. É assim que a comunicação é feita”, explica o texto de apresentação publicado no site do Jornal.


Dentre os desafios de se produzir jornalismo comunitário está o contato com as fontes, o relacionamento com as instituições e os estereótipos sobre as periferias. No entanto, a falta de recursos é um dos fatores que mais prejudica a produção do material e, com o Boca de Rua, a situação se agrava. Em matérias e documentários, o veículo contempla desde experiências individuais e coletivas vivenciadas pelos integrantes e até manifestações sociais. Porém, o trabalho é limitado por perseguições, preconceitos e acusações sem fundamento que levam à perda de apoiadores.


O assassinato e a morte de amigos em situação de rua também foram um dos fatores que mais abalaram os integrantes durante os 18 anos de história do jornal. Mas também serviu de impulso para a produção de conteúdos que denunciem e se opunham às injustiças sociais.

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Jornal Boca de Rua participa da 60ª Feira do Livro em Porto Alegre/RS. (Foto/Arquivo pessoal Lívia Saggin)

Lívia Saggin, professora e doutora em Comunicação, participa do projeto coordenando e monitorando pedagogicamente as produções. Segundo Lívia, os comunicadores comunitários produzem um material único e totalmente diferente da mídia tradicional. “Tentamos trabalhar a qualidade da produção comunicacional prezando sempre pela apuração, checagem, aprofundamento das pautas e temas com o objetivo de levar um material diferenciado ao público. Trabalhamos com fontes diferenciadas de maneira a dar voz a todos os lados, diferentemente dos veículos da grande mídia, que geralmente recorrem somente às fontes oficiais”, analisa.

De acordo com a professora, o trabalho do jornalismo comunitário se faz extremamente importante e necessário como uma ferramenta de resistência, luta e alcance da cidadania. “O jornalismo de massa se desenvolve a partir de uma lógica mercadológica, que acaba apagando pautas que são de interesse público e de necessidade legítima de comunidades e espaços periféricos que são espaços importantes da cidade”, finaliza.


A comunicação comunitária como instrumento de transformação social

A comunicação comunitária teve sua origem nos movimentos populares dos anos 1970 e 1980, em um cenário marcado pela censura, pela insatisfação popular e pela dominação dos grandes veículos de comunicação. Na época, os conteúdos produzidos continham abordagens críticas ao governo ditatorial, o que favoreceu o surgimento da comunicação comunitária como instrumento na luta pela liberdade de expressão.

Estes veículos também foram criados com o intuito de democratizar a informação e dar voz a uma comunidade para produzir e disseminar conteúdos culturais e educativos, valorizando as suas identidades locais. Além disso, atribuem aos sujeitos o poder de comunicar e transformam os membros de uma comunidade em protagonistas sociais, desafiando os critérios de noticiabilidade da grande mídia.


A presença do discurso de oposição

A comunicação comunitária permite viabilizar pautas regionais que não estão incluídas no cotidiano das grandes mídias por não se encaixarem em critérios de noticiabilidade que visam aumentar a audiência. Isso pode ofuscar pautas que são relevantes para comunidades que anseiam para serem ouvidas não apenas pela mídia, mas, sobretudo, pelo poder público. As editorias regionais dos grandes veículos procuram preencher essa lacuna, mas em cidades muito populosas, o jornalismo local da mídia tradicional não consegue representar a todos.


Através da constituição brasileira, o Estado garante o acesso à comunicação para todos, sem distinção de gênero, etnia, classe ou sexualidade. O Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT) atua regulamentando a concessão de autorizações em serviços de televisão e rádio. Além disso, o CBT estabelece que as empresas privadas devem destinar um espaço da grade para o conteúdo local.


No entanto, de acordo com o informe da pesquisa de Produção Regional na TV aberta brasileira, realizada em 2009, das 58 emissoras analisadas de 11 capitais brasileiras, a média de tempo de programação dedicada à produção local foi de 10,83%. Segundo o CBT, o percentual deveria ser de 15% para conteúdos locais.


 
 
 

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